O silêncio do quarto à meia-luz era roubado pouco a pouco pelos tórridos gemidos que jorravam dos lábios do casal enroscado no emaranhado de lençóis na cama.
As mãos dele, tão ávidas, percorriam as curvas da moça e apertavam sua carne macia. As dela se moviam nas costas do homem, suas unhas marcando a pele dele com arranhões de paixão.
Os corpos se moviam em sintonia, indiferentes a qual dos dois conduzia aquele tango horizontal. A sensualidade envolvia o cômodo como uma alma penada vagando no mundo.
O pudor fora posto para fora por um chute do pecado e desaparecera no ar.
Os sussurros arfantes e munidos de palavras ardentes eram depositados cuidadosamente no ouvido do parceiro, sorrisos maliciosos se formavam no canto da boca, mascarando a inocência há muito perdida.
O excesso regia os sentidos, era pedido mais de tudo e então os desejos se realizavam. Mais toques, mais desordem no caos sobre o colchão umedecido, mais suor, mais luxúria e mais outros vários pormenores que embalavam o ato não ensaiado.
Ao final de tudo, os corpos se descolavam, os olhares se escondiam e os pensamentos vagavam em outros lugares até retornar ao mesmo ponto de partida.
Depois do espetáculo encerrado e das palmas de aprovação expelidas, o silêncio voltou a pairar no local, esperando pacientemente por uma ruptura que não demorou a surgir.
– Você quer um café? – ela perguntou despretensiosamente, com a cabeça apoiada no braço, encarando o homem que mantinha o olhar fixo no teto.
– Eu aceitaria algo mais gelado – ele admitiu com um sorriso brincalhão.
– Que tal uma taça de vinho?
– Seria ótimo.
Ela libertou-se do lençol e cortou a escuridão até a porta, a silhueta de seu corpo desenhada no espaço onde o luar penetrava no ambiente.
Um corpo gracioso e provocante, uma mistura de moça boa e mulher fatal.
Na cozinha, ela apanhou duas taças e a garrafa de vinho branco na geladeira.
Antes de retornar ao quarto, olhou tudo ao redor, uma pia com pratos sujos, armários vazios e várias caixas espalhadas pelo chão.
Aquela era a primeira noite dos dois na casa nova.
As paredes ainda cheiravam a tinta fresca, estavam nuas de quadros e virgens de marcas de sujeira. A estante na sala aguardava os porta-retratos que logo a usariam de pedestal.
Pouca coisa havia sido desencaixotada.
O homem surgiu no breu, silencioso sobre seus pés descalços e vestindo apenas o corpo suado.
– Achei que você tivesse se perdido no caminho de volta – ele brincou.
Ela caminhou até ele, entregou-lhe as taças e serviu o vinho.
O beijo que se seguiu foi gelado e levemente frisante.
– Promete que nunca vai me abandonar?
– ela perguntou olhando dentro dos olhos noturnos dele.
– Essa é a promessa mais fácil de cumprir – ele rebateu e a cozinha se tornou o palco de uma nova cena de amor.
Ela abriu os olhos e despejou as lágrimas que estavam presas.
Desprendeu-se do devaneio e encarou a fotografia que um dia fora um momento presente e logo em seguida fechou o álbum.
A casa estava escura, no vento forte a chuva desabou e os relâmpagos clarearam os cômodos vazios.
Quase tudo já havia sido encaixotado.
Todos os quadros retirados, toda a mobília desmontada e toda a saudade contraditoriamente imensa e no encaixe perfeito da palma da mão.
Ele cumprira a promessa fielmente até seu último suspiro e para ela, viver naquela casa sem sua presença seria um doloroso martírio, por isso ela decidira se mudar dali, exatamente no dia em que completava um ano da primeira mudança.
O amor não escolhe qual história vai durar para sempre, ele eterniza o tempo efêmero que uma vida a dois possui…
IGOR HUNSAKER.