AS SANTAS PASSEIAM NO INFERNO …

Santa não desiste, se cansa. A Santa tem essa coisa de ir até o fim, esgotar todas as possibilidades, pagar pra ver. A Santa paga mesmo. Paga caro, com juros e até parcelado. Mas não tem preço sair de cabeça erguida, sem culpa, sem "E se"! A Santa completa o percurso e ás vezes fica até andando em círculos, mas quando a Santa muda de caminho, nossa, é fim de jogo para nós. Enquanto a Santa enche o saco com ciúmes e saudade, para de reclamar e agradeça! Porque no dia que a Santa aceitar tranquilamente nos dividir com o mundo, a Santa ficou mais compreensiva, a Santa parou de se importar, já era. Quem ama, cuida! E a Santa cuida até demais, mas dar sem receber é caridade, não carinho! E elas estão numa relação, não numa sessão espírita. A Santa entende e respeita nosso jeito, desde que nós a supramos pelo menos o mínimo das suas necessidades, principalmente emocionais, porque carne tem em qualquer esquina. Muitos homens não sabem, mas além de peito e bunda, a Santa tem sentimentos, quase sempre a flor da pele. São damas, não dramas, procurem entendê-las. Santa não é boneca inflável, só tem quem pode! Levar muitos corpos pra cama é fácil, quero ver conquistar corpo e alma de uma mulher que na verdade são verdadeiras SANTAS.

“Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”

Vinícius de Moraes repetia sempre isso, principalmente quando estava tentando começar um namoro, trocar de mulher, viver a vida louca.

Eu respondia: ─ O que é isso, poeta? Superstição?

E ele dizia: ─ Mulher bruxa é pior que baiana, te enfeitiça e você não consegue sair, só chorando muito ou tomando banho de erva brava.

E continuávamos a beber porque afinal já passava das dez horas da manhã e era quarta-feira. Numa véspera de sábado resolvemos tentar definir o que seria uma mulher bruxa. Estávamos na eterna Ipanema, num dos bares daquelas esquinas quase no mar e Tom discutia minha escolha de Shirley Horn cantando “Come a little closer” como uma das dez melhores canções de jazz do mundo. Vinícius, sério e de ressaca, saiu com sua frase preferida: ─ Essa mulher é uma bruxa!

E assim, a partir dessa afirmação categórica do poeta, entramos no assunto e resolvemos definir mulher bruxa e criar um manual contra elas.

─ Mulher bruxa é sempre alta ou gorda, as magras e pequenininhas não têm perigo.

─ E magra alta?

─ É perigoso.

─ As louras? Podem ser bruxas?

─ Claro. As vikings. As mais perigosas. Se transformam. Beijam e não perdem o olhar frio, vazio, sempre em outro mundo.

─ Mulata também?

─ Aí, não, né, mulata é candomblé, macumba, África mãe, são bruxas da natureza, se mexem como cobras e riem como mulher no cio. Te comem por dentro e cheiram a alecrim.

─ Mas, afinal, como você descobre se ela é bruxa ou não é?

─ Companheiro, é difícil. Elas sabem disfarçar. Tem homem casado há 60 anos que ainda não descobriu. Outro dia um amigo meu quebrou a perna, andando, assim, nem estava bêbado, nem nada, nem estava olhando bunda de mulher, nada, andando como espanhol vaidoso e bumba! Caiu e quebrou tornozelo, braço, nariz, um desastre! Descobrimos no hospital que ele era casado com uma mulher bruxa. Dezesseis anos e ele pensava que era feliz, uma traição aqui, outra ali, mas nada sério, ainda a chamava de “meu amor” e até beijava na boca. Até que ganhou na loteria, uma mixaria de dinheiro, mas mulher bruxa, já sabe, ele não dividiu o dinheiro e se quebrou todo. E era morena, grande, fogosa, tinha um olhar de sedução, no entanto era bruxa.

─ Mas afinal, temos que nos proteger, vamos fazer um manual contra elas. Vocês entendem tudo de mulher, fazem música para elas, poesia para elas, tem gente amando por aí, recitando teus versos e a música do maestro, e o perigo solto, as bruxas ameaçando, não dá, temos que resolver isso e hoje!

Vinícius ficou sério, estava no segundo whisky, precisava de três para curar a ressaca, mas dois já começavam a clarear seu pensamento. Ainda não dava para fazer poesia, mas para criar um manual contra bruxas era possível.

Pedimos papel, arrumamos uma bic de garçom e, como todas as bics de garçom, quase sem tinta. Colocamos o papel no centro da mesa, afastamos os copos, secamos em volta e, com ar de executivos inteligentes, começamos a pensar.

A energia estava chegando quando uma garota do outro mundo parou e pediu, cheia de jeito, um autógrafo do poeta e do maestro. Ainda virou para mim e perguntou: ─ Você faz alguma coisa? É famoso?

Respondi o de sempre: ─ Não, sou só professor de ballet dos dois, eles estão dançando muito bem! – Ela me olhou com espanto, balançou o corpo e foi para o mar.

Ipanema era Ipanema ainda. Cheirava a maresia e tinha prédios pequenos, cheia de casas, ar de cidade do interior e muita, mas muita mulher bonita. Começavam a aparecer os biquínis tipo fio dental e o píer estava lá, a lata tinha apenas um mês e ainda era assunto de todas as conversas.

A lata, para quem não sabe, aconteceu porque um navio africano, de frete, meio velho, foi perseguido pela guarda marinha e jogou ao mar, em frente a Ipanema, um carregamento de latas cheias com uma das melhores marijuanas do mundo.

A maré trouxe essas latas para a areia e assim, numa bela manhã de sol, nas areias de uma das praias mais lindas do mundo, era só pegar a lata e ficar feliz por muitos dias. Com o tempo surgiram os caçadores de latas, que cobravam um fee para mergulhar atrás do tesouro. As notícias falavam em mais de 30 mil latas e já havia mais de cem mil falsificações. Uma lataria em Marechal Hermes, subúrbio do Rio, já entregava a lata com o produto dentro, até com cheiro de mar e sal nas bordas, começando a enferrujar, trabalho perfeito!

Depois da interrupção discutimos ainda por uns quinze minutos o corpão da garota e terminamos dando nota, porque o maestro sempre se queixava da nossa absoluta falta de gosto para mulher.

─ Mulher tem que ter ritmo, balançar certo, não pode ser só bunda e coxas e um seio cheio de graça, tem que ter mais, vocês estão ficando velhos, qualquer coisa queimada e de voz arrastada vocês dão dez. Que é isso! Dez é para musa, eu dou dez para Edith Piaf que é muito feia, mas que mulher!

Aí todos concordamos, quem não ia dar dez para Edith Piaf, só louco. Também concordamos num oito com louvor para a menina que passara e voltamos ao assunto de nossa reunião, o manual contra bruxas.

─ Temos que abrir o manual com uma declaração – falou o poeta –não podemos começar condenando. Mulher não se condena, se entende, se foge, se for preciso, mas condenar, nunca!

Aceitamos, afinal se a bruxa é bonita porque condenar? Depois de três caipirinhas – trocamos de bebida porque a ressaca do poeta já passara – ainda nem tínhamos escrito a primeira palavra. O papel estava lá, as bics estavam lá, mas texto que é bom, nada.

Tentávamos concentrar-nos quando passou um carro com a bandeira do Fluminense. Aí participamos, “vai Flu”!, Eu disse bem alto, afinal tínhamos Rivelino no Maraca. O poeta, vascaíno, me olhou com um desprezo arrasador e sacou: ─ Viemos trabalhar ou falar bobagens? Se gosta tanto do Rivelino vai ser gandula para ficar perto dele, dar bola para ele, teu herói.

Como sempre esta frase inesperada nos levou a discutir futebol. Foram mais de dez caipirinhas e muita mulher boa passando para, finalmente, voltarmos ao conteúdo de nossa reunião, o manual contra as bruxas.

Mas era impossível parar, não chegávamos a acordo nenhum, até usamos palavras duras para defender nossas paixões. O maestro, Fluminense como eu, dava opiniões contundentes contra o espírito vascaíno do poeta e, de repente, um vizinho de mesa, um desconhecido, se meteu falando do Flamengo, e então esquentou o tempo.

─ Você não faz parte desta reunião, não se meta, não se manifeste, — dizia o poeta com a autoridade de seus cabelos brancos.

─ Vocês são metidos a bestas, todos podem falar, só porque não somos famosos temos que ficar calados, isto é um bar e não é de vocês.

Como o assunto estava explodindo, o Manuel, português, dono do bar, vascaíno, pediu silêncio e ofereceu uma rodada gratuita de bebida para todos se trocássemos de assunto e não brigássemos mais. Recebeu uma ovação, juras de amor entre todos e pedidos de bis, afinal, quem não gosta de beber de graça num bar de Ipanema!

Voltamos ao nosso assunto e como o poeta dizia que o sábado estava chegando, resolvemos apressar os trabalhos. Cada um iria escrever umas cinco linhas de introdução e depois comparávamos, editávamos e assim faríamos o manual a seis mãos, uma verdadeira salada alemã.

Concentrei-me e comecei a trabalhar. Não entendia nada de bruxas e de mulher era discutível. Eu me apaixonava muito e a toda a hora. Num mesmo dia era capaz de ter mais de três grandes paixões e todas para a vida inteira. Acordava no dia seguinte, fazia poesia, tocava música, ia para a praia, contava para a turma das minhas paixões da véspera e no pôr do sol já tinha esquecido tudo.

Assim comecei a pensar e escrever o que seria essa tal de mulher bruxa, e foi saindo um texto assim: “Mulher é sempre mulher. Não se entregue com medo. É bom ficar apaixonado. Todas elas merecem, até as bruxas! Os cuidados que se tem de tomar são simples. Contra mulher bruxa todo o cuidado é pouco. Não se importe com o coração, esse ela vai levar de qualquer maneira: tenha cuidado com a liberdade, essa, mesmo com o coração comprometido, tem de ser mantida, e bruxa gosta de tirar a liberdade e ela não faz isso de uma vez, ela vai aos poucos, com cheiros, balanços, jeitos de fazer amor, palavras quentes, ela te aprisiona e quando você vê a praia foi esquecida, o bar nunca mais e até os amigos ficaram para trás.”

“Preserve a alegria e não abandone os amigos, mulher bruxa gosta de tristeza aqui e ali e de assustar com palavras de comando. Mesmo que você já tenha descoberto que ela é bruxa, mantenha o equilíbrio e as palavras de carinho. A ternura e o carinho permanentes são capazes de aquietar a bruxa e tiram a força de suas mágicas.”

“A mulher bruxa quando está apaixonada pode ajudar você. Entregue o comando a ela e fique só fazendo amor. Deixe que ela use você como objeto sexual, as finanças vão crescer. Mantenha a liberdade e a alegria e não esconda nada, elas sabem tudo, até o segredo do cofre.”

“Quando se cansar dela não se separe quebrando pratos ou dividindo os CDs. Espalhe lágrimas, chore de saudade antes de a saudade chegar e ande cabisbaixo, solitário e entristecido. Se ela perguntar como e por que, diga que é para o bem dela, você está sofrendo para ela ter um futuro melhor, você não é suficientemente bom para ela. Exagere nos seus erros, diga que sempre sonhou com uma mulher como ela, mas o tempo fez você perder esse direito.”

“Guarde luto por um mês. Não frequente bares, nem vá à praia. Faça amor escondidinho e ouça música baixo como quem está rezando. Nunca mostre alegria durante o período de luto e só tome vodka pura. É tiro e queda contra bruxaria brava.”

“Não se apaixone, durante esse tempo, por louras ou mulatas, só morenas. E têm que ser altas e de pernas fortes. De preferência bruxas também, bruxa contra bruxa dá lobisomem e então você vai fazer amor como um leão.”

“Não tente ir ao futebol, seu time vai perder. Jogar no bicho, nem pensar. Pôquer, jamais. O período de luto é sério e sem ele as bruxas tomam conta e você nunca mais se levanta.”

“Não coma coxinha de galinha nem empada de camarão, são mortais e podem envenenar você para sempre. Caviar e champanhe não têm perigo.”

“Ande sempre pela direita, esquerda só serve para políticos. Não atravesse no sinal, alguém vai avançar. Atravesse sempre fora do sinal e não olhe para os carros, eles vão parar.”

“Passados os trinta dias de luto faça uma grande festa. Com carnes saborosas e vinho vermelho. Muita música e poesia, afinal, você está livre de novo e a bruxaria passou. Faça amor com uma loura, se enrosque, se apaixone, fale alto e a encha de beijos em todos os lugares. Procure os amigos, conte histórias e ria sem parar. Uma caipirinha é de bom tom e todos os dias da semana vão ser sábado.”

“Mas lembre-se sempre: não tem remédio contra bruxa, não existe vacina e assim até a loura da comemoração pode ser uma. Entregue-se com prazer, sabendo que o mundo é a grande paixão de quem está vivo.”

“Não esqueça o carinho, os pequenos presentes, as palavras doces, a flor sempre escondida, aquela música que fala ao coração, o romantismo. Bruxa não resiste ao romantismo, mesmo cheia de magias ela se entrega, e não diga nunca que você já teve outra bruxa, elas gostam de ser únicas.”

Quando parei de escrever o poeta e o maestro começaram a aplaudir.

─ Como você pode se concentrar tanto, estamos em Ipanema, meu amigo, o centro do mundo e das mulheres gostosas, já passaram duas infernais por aqui, bruxas, mas lindas, o Manuel já deu mais duas rodadas de bebida de graça e o Rivelino já fez dois gols e você aí escrevendo. Fenômeno, amigo, fenômeno. Seu texto está aprovado por unanimidade. Vamos mandar imprimir e distribuir gratuitamente pela praia.

─ E vocês… Não escreveram nada?

─ Pra quê? Já é quase sábado e trabalhar nem pensar!

─ Fui explorado, declarei, e fiz cara de ofendido.

─ Manuel, mais duas caipirinhas de graça para nosso escritor e manda vir aquela loura que está no bar.

─ Loura, nem pensar, respondi, está ficando de noite e a esta hora só morenas.

O maestro se levantou e disse solenemente.

─ Fica adiada para amanhã a publicação e leitura do manual contra as bruxas. Até lá todas as mulheres do mundo estão liberadas para amar e nós, homens sem medo, temos total liberdade para nos apaixonar por elas.

Saiu andando naquele seu andar cadenciado, andar de maestro, no ritmo certo. O poeta olhou para mim e repetiu a pergunta de sempre.

─ Anoiteceu, é hora de beber, não achas?

─ Onde?

─ Vamos ao Rond Point em Copacabana e depois vamos ouvir uma boa música, e se der sorte encontramos umas bruxas para aprender como elas são.

Seguimos pela noite de Copacabana, e como não podia deixar de ser, amanhecemos abraçados a duas bruxas maravilhosas.

Pra que escrever manual contra isso? pensei, olhei de novo para minha bruxa loura e me entreguei a uma paixão sem remorsos.

Como diria Vinicius:

─ Oxalá!

hunsaker

Sou o que sou. Sou incoerente por vezes, sou sonhador sempre, temo o desconhecido sem contudo deixar de arriscar, tenho planos e projetos, construí e ví cair em minha frente castelos. Como um anjo voei aos céus mas longínquos, e como um cometa caí. A queda me machucou, contudo me fez mais forte. Sou falho e impreciso. Simplesmente indefinível, enfim sou apenas um IGOR mas, o IGOR HUNSAKER.

18 comentários em ““Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”

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